ARTIGOS ORIGINAIS


CÂNCER COLORRETAL EM PACIENTES COM IDADE INFERIOR A 30 ANOS

CHRISTIANO DE ALMEIDA DRUMOND
RICARDO ALEXANDRE FERNANDES FERRO
ANA MARGARIDA FERREIRA NOGUEIRA
MAGDA MARIA PROFETA DA LUZ - ASBCP
SÉRGIO ALEXANDRE DA CONCEIÇÃO
RODRIGO GOMES DA SILVA
ANTONIO LACERDA-FILHO _ TSBCP

DRUMOND CA, FERRO RAF, NOGUEIRA AMF, PROFETA da LUZ MM, CONCEIÇÃO SA, SILVA RG, LACERDA-FILHO A. Câncer colorretal em pacientes com idade inferior a 30 anos. Rev bras Coloproct, 2003;23(3):147-154

Resumo: Existe controvérsia quanto ao prognóstico do câncer colorretal (CACR) em pacientes jovens, admitindo-se que esse grupo de indivíduos tenha tumores localmente mais agressivos e com maior capacidade de disseminação à distância. O objetivo deste estudo foi avaliar a apresentação do CACR em pacientes com idade abaixo de 30 anos, no que diz respeito ao diagnóstico, ao tratamento instituído, aos aspectos anátomo-patológicos e à evolução da doença, através de estudo retrospectivo de 8 casos de adenocarcinoma de cólon e reto atendidos em nosso serviço entre 1997 a 2002. Os pacientes incluídos representaram 2,39% (8/334) dos casos tratados nesse período, com preponderância do sexo masculino numa relação de 3:1. A idade variou de 21 a 29 anos, com média de 25 anos para esse grupo. Os sintomas mais prevalentes foram alteração do hábito intestinal e emagrecimento. A história familiar esteve presente em dois casos. O tempo médio decorrido entre os primeiros sintomas e o diagnóstico foi de 10 meses. Metade dos pacientes foram operados em caráter de urgência, sendo que cirurgias alargadas foram realizadas em 50% dos casos. A maioria das lesões se encontrava no ceco, sigmóide e reto (75%), sendo observada invasão da serosa em 87,5% delas. À histologia, 50% dos tumores foram classificados como pouco diferenciados. O seguimento médio foi de 30,4 meses. A sobrevida média global foi de 23,6 meses. A sobrevida média livre de doença foi de 16,6 meses. Ocorreram 4 óbitos e houve perda de seguimento de um paciente. Pacientes com câncer colorretal (CACR) abaixo dos 30 anos são usualmente bastante sintomáticos, sendo portadores de doença avançada ao diagnóstico com tendência a apresentar pior prognóstico.

Unitermos: câncer colorretal, câncer, pacientes jovens

INTRODUÇÃO
O câncer colorretal (CACR) é uma doença predominantemente de indivíduos idosos, sendo diagnosticada em 90% dos casos em pacientes acima de 50 anos16. A incidência do CACR em pacientes com idade inferior a 40 anos varia entre 2% a 6%1,6,9,15. Há contínuo debate quanto ao prognóstico do CACR em pacientes jovens, acreditando-se que esses indivíduos desenvolvam tumores localmente mais agressivos e com maior capacidade de metastatizar-se, quando comparados a indivíduos mais idosos1,9,13, 15, 16,18,22.
    A maioria dos estudos que avaliaram pacientes jovens com CACR inclui aqueles com idade igual ou inferior a 40 anos1,3,4,6,9,11,12,15,25 . Entretanto, poucas séries têm sido publicadas sobre pacientes ainda mais jovens que desenvolvem esse tipo de neoplasia. O presente estudo tem o objetivo de avaliar um grupo de pacientes com CACR, com idade menor do que 30 anos, no que diz respeito ao diagnóstico, ao tratamento instituído, aos aspectos anátomo-patológicos e à evolução da doença.

PACIENTES E MÉTODOS
Foram analisados retrospectivamente 334 prontuários de pacientes com câncer colorretal tratados pelo Grupo de Coloproctologia e Intestino Delgado do Instituto Alfa de Gastroenterologia do Hospital das Clínicas da UFMG, no período de janeiro de 1997 a dezembro de 2002. Foram identificados oito pacientes com diagnóstico histopatológico de adenocarcinoma de cólon ou reto com idade menor do que 30 anos.
    As variáveis avaliadas foram: a idade, o sexo, a cor, a sintomatologia, o tempo de evolução da doença até o diagnóstico, a presença de fatores de risco, como história familiar, diagnóstico prévio de doença inflamatória intestinal, a localização do tumor, o tipo e o grau de diferenciação histológica, o estadiamento, o tipo de tratamento instituído, a taxa de recorrência local e à distância e a taxa de sobrevida.

RESULTADOS
Os pacientes incluídos no presente estudo representaram 2,39% (8/334) dos casos de CACR atendidos de janeiro de 1997 a dezembro de 2002. Setenta e cinco por cento eram do sexo masculino. Quanto à cor, 50% eram brancos, 25% negros e 25% pardos. A idade variou entre 21 e 29 anos, com média de 25 anos. O tempo médio de acompanhamento desta série foi de 30,4 meses.
    Os sintomas mais prevalentes foram a alteração do hábito intestinal e o emagrecimento, ambos presentes em 75% dos casos; seguidos por dor abdominal (62,5% dos casos), hematoquezia e anemia (37,5% cada). O tempo médio decorrido entre os primeiros sintomas e o diagnóstico foi de 10 meses. A história familiar de CACR esteve presente em dois casos. Nenhum dos pacientes era portador de polipose colônica ou doença inflamatória intestinal prévia.
    Quanto à localização do tumor primário, dois se localizavam no ceco (25%),sendo um deles com fixação e comprometimento de toda a pelve; um se encontrava no ângulo esplênico com invasão da cauda do pâncreas (12,5%); dois se localizavam no sigmóide (25%) e outros dois se encontravam no reto (25%). Em um dos casos não foi possível definir a localização do tumor primário, pois este foi ressecado previamente em outro serviço. Carcinomatose peritoneal sincrônica estava presente em 25% dos casos e carcinomatose metacrônica ocorreu em 37,5% dos casos. Dois casos (25%) apresentavam metástases hepáticas sincrônicas.
    O quadro 1 sumaria os dados clínicos referentes aos oito pacientes do presente estudo.

Quadro 1 - Apresentação clínica do CACR em 8 pacientes com idade inferior a 30 anos.

Pacientes Idade Sintomas Localização Carcinomatose - Meta a distância Tipo histológico Estadiamento
Paciente 1 25 Dor abdominal, alt. hábito intestinal e obstrução intestinal Ângulo esplênico Não
Metástase hepática
Adenocarcinoma soe pouco diferenciado pT4N1M1
Paciente 2 26 Emagrecimento, anemia, dor abdominal Ceco Não Adenocarcinoma soe moderadamente diferenciado pT3N0Mx
Paciente 3 24 Emagrecimento, hematoquezia, anemia, dor abdominal, alt. hábito intestinal Sigmóide Não Adenocarcinoma soe moderadamente diferenciado pT3N0Mx
Paciente 4 28 indeterminados indeterminado Sim
Metástase hepática
indeterminado pTxNxM1
Paciente 5 22 Emagrecimento, anemia, dor e massa, alt. hábito intestinal Ceco Não Adenocarcinoma mucinoso pouco diferenciado pT4N0Mx
Paciente 6 20 Emagrecimento,dor abdominal e alt. hábito intestinal Sigmóide Sim Adenocarcinoma soe bem diferenciado pT3N1Mx
Paciente 7 29 Emagrecimento, hematoquezia, tenesmo,mucorréia, alt. hábito intestinal Reto Não Adenocarcinoma soe pouco diferenciado pT4N1Mx
Paciente 8 21 Emagrecimento, hematoquezia e alt. do hábito intestinal (constipação) Reto Não Adenocarcinoma com céls. anel de sinete - pouco diferenciado pT4N1Mx

 

    Todos os pacientes da presente série foram submetidos a tratamento cirúrgico, 75% deles com finalidade curativa. Cirurgia em caráter de urgência por abdome agudo obstrutivo foi inicialmente realizada em metade dos casos. Em pelo menos 50% dos casos, foram realizadas ressecções alargadas. No caso 1 foi necessária pancreatectomia corpo-caudal e esplenectomia devido à invasão tumoral da cauda pancreática. No caso 3 realizou-se cistectomia parcial, salpingo-ooforectomia esquerda, esvaziamento linfonodal retroperitoneal e ressecção de fístula êntero-cutânea. No caso 5, além da cirurgia padrão, houve necessidade de cistectomia, prostatectomia, enterectomia, ressecção de parte da parede abdominal e construção de neo-bexiga e no caso 6 houve necessidade de apendicectomia e peritoniectomia pélvica (quadro 2).


Quadro 2 - Tratamento realizado, complicações, recorrência e sobrevida em 8 pacientes portadores de CACR.

Paciente Tratamento cirúrgico Complicações Recorrência Sobrevida global* Sobrevida livre de doença*
Paciente 1 Laparotomia exploradora de urgência: colectomia transversa, pancreatectomia corpo-caudal, esplenectomia, esvaziamento linfonodal. Empiema pleural Recidiva em cabeça do pâncreas e carcinomatose metacrônica 33 meses
ÓBITO
14 meses
Paciente 2 Colectomia D Não Não 43 meses 43 meses
Paciente 3 Retossigmoidectomia, ressecção de fístula entérica, cistectomia parcial, salpingectomia e ooforectomia E Não Não 34 meses 34 meses
Paciente 4 Laparotomia em outro serviço.
Tentativa de ressecção de metástases hepáticas após QT
Não Carcinomatose sincrônica e aumento das metástases hepáticas 18 meses
ÓBITO
Não houve
Paciente 5 Laparotomia de urgência realizada previamente em outro serviço. Exenteração pélvica Fístula colônica, deiscência de ferida, estenose da anastomose colo-anal Recidiva local e carcinomatose metacrônica 20 meses
ÓBITO
8 meses
Paciente 6 Laparotomia exploradora de urgência: colectomia E, peritoniectomia pélvica, apendicectomia e ileostomia protetora Sangramento sacral em lençol refratário, deiscência total da anastomose colorretal, choque séptico e hemorrágico Carcinomatose sincrônica 1 mês
ÓBITO
1 mês
Paciente 7 Retossigmoidectomia com excisão total do mesoreto e ileostomia protetora Não Não 16 meses 16 meses
Paciente 8 Laparotomia exploradora de urgência: colostomia descompressiva + biópsia Semi-obstrução intestinal, hidronefrose E Carcinomatose metacrônica, enterite actínica (by-pass jejuno- transverso) Perda de seguimento Perda de seguimento
* até março de 2003

 

    Ao estudo anátomo-patológico, 50% dos tumores foram classificados como pouco diferenciados e 25% como moderadamente diferenciados, sendo os outros 12,5% classificados como bem diferenciados. Em um paciente não foi possível a obtenção do detalhamento histopatológico. O tipo histológico em um caso foi classificado como adenocarcinoma mucinoso e em outro caso, como adenocarcinoma com células em anel de sinete (25%). Os demais foram classificados como adenocarcinoma soe (sem outra especificação). Polipose colônica associada não ocorreu em nenhum paciente da presente série, mas foram encontrados pólipos adenomatosos esparsos em peças cirúrgicas de três pacientes (37,5%) (Quadro 1).
    Em relação ao estadiamento, observou-se invasão da serosa do órgão pelo tumor em 7 casos (87,5%), sendo que em quatro casos (50%) havia invasão de outros órgãos ou estruturas (T4). Havia linfonodos acometidos (N1) em 50% dos casos e metástases à distância (M1) em dois casos, sendo os demais considerados indeterminados (Mx). Em um caso não foi possível estabelecer o estadiamento TNM (Quadro 1).
    Foi indicado tratamento neoadjuvante para dois pacientes (pacientes 7 e 8). O primeiro realizou radioterapia (5040 CyGr) em 28 semanas, associada à quimioterapia (5-fluoracil e leucovorin) com boa resposta. O mesmo não ocorreu com o paciente 8, que apresentou pouca resposta ao tratamento neoadjuvante, com mínima regressão da lesão. O tratamento adjuvante com quimioterapia foi indicado, a priori, em todos os pacientes, tendo sido realizado em cinco (62,5%). Os outros três pacientes foram a óbito antes do início da quimioterapia.
    As reoperações ocorreram em cinco casos, sendo necessárias mais de uma intervenção em três casos. A principal indicação foi o abdome agudo obstrutivo devido a carcinomatose peritoneal (37,5%), estando em um deles associado a icterícia obstrutiva. As outras indicações foram: recorrência local (25%), tentativa de ressecção de metástases hepáticas após quimioterapia (12,5%), paliação com by-pass jejuno-transverso com anastomose látero-lateral (12,5%) e complicações inerentes ao ato operatório, como deiscência de anastomose, coleções intra-abdominais e sangramento sacral refratário (12,5%).
    A sobrevida média global desse grupo de pacientes foi de 23,6 meses e a sobrevida média livre de doença foi de 16,6 meses. A taxa de sobrevida global em 2 anos foi de 37,5%. Ocorreram 4 óbitos (50%) e houve perda de seguimento de um paciente.
    O tratamento realizado e suas complicações, assim como a ocorrência de recorrência e a sobrevida alcançada em cada caso, encontram-se listadas no quadro 2.

DISCUSSÃO
No presente estudo, o CACR em pacientes com idade inferior a 30 anos apresentou uma incidência de 2,39% dentre todos os casos de CACR atendidos em nosso serviço num período de seis anos. Nas séries publicadas de CACR em pacientes com idade até 30 anos de idade, a incidência nessa faixa etária foi mencionada apenas em um estudo proveniente da África Central, tendo atingido o expressivo percentual de 23,6%21.
    Englobando pacientes de até 35 anos de idade, Adkins et al1 encontraram uma incidência de 6,3% entre 705 casos de CACR estudados. Com relação ao sexo, houve predominância do sexo masculino numa relação de 3:1.
    Marble et al12 , estudando retrospectivamente 50 pacientes com CACR com idade igual ou inferior a 40 anos, não observaram diferenças relativas ao sexo, cor, história familiar, sintomas à apresentação ou alterações ao exame clínico. Sule & Mandong21, avaliando 35 pacientes com câncer colorretal abaixo de 30 anos, também encontraram um leve predomínio de pacientes do sexo masculino (1,2:1).
    O tempo médio decorrido entre os primeiros sintomas e o diagnóstico na presente série foi de 10 meses, sendo maior do que o de outras séries de CACR em jovens, já publicadas. McGahren et al13 , estudando 37 casos de câncer colorretal em pacientes com idade menor ou igual a 30 anos, encontraram uma média de 2,3 meses entre o início dos sintomas e o diagnóstico.
    MacGillivray et al11 observaram duração média de 4,9 meses entre o início dos sintomas e o diagnóstico. Em outro estudo, Kyle et al8 relataram média de 3 meses de duração dos sintomas até o diagnóstico. Esse período de tempo mais longo observado em nossa série reflete, provavelmente, o retardo na procura de assistência médica por indivíduos mais jovens, que julgam ser portadores de condições de pouca relevância clínica. Marble et al12 também observaram que pacientes mais jovens, com idade inferior a 40 anos, esperaram significativamente mais tempo antes de procurar assistência médica, quando comparados com pacientes acima dos 40 anos.
    Além disso, parece haver uma tendência de realizar-se diagnóstico clínico inicial de doença benigna em pacientes jovens, sobretudo abaixo de 30 anos de idade, uma vez que a presença de neoplasia é freqüentemente considerada como uma condição clínica de pacientes idosos. Isto reflete a necessidade de um aprimoramento da educação médica, no sentido de suspeitar-se de doença neoplásica quando houver sintomatologia sugestiva, mesmo em indivíduos jovens21. É importante ainda que ocorra uma maior conscientização de médicos generalistas que geralmente prestam o primeiro atendimento a esses pacientes, sobre a possibilidade da ocorrência de CACR em pacientes jovens, principalmente relacionado às síndromes hereditárias _ câncer colorretal hereditário sem polipose (HNPCC) e polipose adenomatosa familiar (PAF).
    No que diz respeito à duração dos sintomas e sua relação com o estadiamento, quando do diagnóstico da doença, parece haver controvérsia na literatura. Alguns autores, como Kyle et al não observaram uma relação positiva entre a duração da sintomatologia e o estágio da doença ao diagnóstico8. Por outro lado, Mills et al14, estudando 16 casos de CACR em pacientes com idade menor ou igual a 30 anos, relataram que 68% dos pacientes apresentavam metástases ao diagnóstico, a despeito da curta duração dos sintomas.
    A influência da história familiar tem sido considerada o fator de risco mais importante para o CACR nesse grupo de pacientes jovens22. Na presente série, a história familiar de CACR somente foi encontrada em dois casos (25%), sendo que em ambos tratava-se de familiares de 2o grau. Em um deles, dois tios maternos tiveram câncer de cólon e em outro, o avô materno. Poderia especular-se sobre a possibilidade dos outros pacientes dessa série serem casos-índice de mutações genéticas com potencial hereditário. O mais provável, entretanto, é que tenha havido falha na coleta rigorosa de dados a fim de se compor uma história familiar fidedigna para a ocorrência de neoplasias. Há que se considerar ainda que, pelos critérios de Bethesda para HNPCC, tais pacientes seriam candidatos a testes genéticos para confirmação dessa condição, o que poderia ter determinado o caráter hereditário de sua doença17,19.
    Deve ser salientado, entretanto, que outras condições pré-cancerosas como as síndromes poliposas hereditárias (PAF, Gardner e Turcot), os adenomas vilosos e a retocolite ulcerativa têm sido identificados em poucos casos de pacientes jovens com CACR9,13. Por outro lado, foram encontrados pólipos adenomatosos concomitantes em três casos da presente série (37,5%). Esse dado sugere que maior ênfase deve ser dada a programas de rastreamento, com utilização mais liberal de exames endoscópicos em pacientes pertencentes a grupos de risco para CACR, sobretudo em indivíduos jovens.
    Cusack et al4 , estudando retrospectivamente 186 pacientes abaixo de 40 anos com adenocarcinoma colorretal primário, identificaram três indicadores biológicos de agressividade e potencial metastático dos tumores: células em anel de sinete, margens cirúrgicas infiltradas pelo tumor e grau histológico do adenocarcinoma primário. Além disso, indicadores histopatológicos de maior agressividade, como invasão linfática, vascular ou perineural foram encontrados em porcentagem significativamente maior em pacientes mais jovens, quando comparados aos pacientes acima de 40 anos, portadores de CACR. Isso justifica, em parte, a alta taxa de doença avançada ao diagnóstico em pacientes jovens, como descrito pela maioria dos estudos1,4,9,11,13,15,16.
    As avaliações histológicas dos cânceres colorretais em pacientes mais jovens revelam incidência aproximadamente 4 vezes maior de tumores do tipo mucinoso e isto está associado com o aumento do risco de recorrência local6. Vastyan et al23, estudando 7 crianças e adolescentes tratados para carcinoma colorretal, relataram que o adenocarcinoma mucinoso foi o tipo histológico mais comum. No presente estudo, pelo menos a metade dos tumores foi classificada histologicamente como pouco diferenciado (50%), sendo um caso do tipo mucinoso e outro do tipo de células em anel de sinete, também relacionado intimamente a uma maior produção de mucina. Sabe-se que a ocorrência de tumores mucinosos também é uma característica marcante do HNPCC17.
    Quanto ao estadiamento, em 87,5% dos casos o tumor invadia a serosa e havia presença de células metastáticas nos linfonodos do mesocólon em pelo menos 50% dos casos. Metástases à distância foram evidenciadas ao diagnóstico em dois casos (25%). Trata-se, portanto, de neoplasias bastante avançadas no momento do diagnóstico, que foi firmado tardiamente na maioria dos casos. Isto poderia ser explicado em parte pelo fato de nossos pacientes serem oriundos de camadas sócio-econômicas menos favorecidas, com maior dificuldade de acesso aos serviços de saúde. Em estudo realizado com 615 pacientes portadores de CACR tratados no Harlem Hospital Center, que atende predominantemente a comunidade pobre de afro-americanos de Nova York, Freeman et al5 observaram que a mortalidade por câncer colorretal é elevada entre esses indivíduos. A causa mais importante foi o diagnóstico tardio, já com doença incurável, resultante da combinação dos efeitos da pobreza, da carência de educação e da dificuldade de acesso aos cuidados médicos.
    A absoluta maioria das lesões da presente série foi tratada cirurgicamente, com finalidade curativa, sendo que, em pelo menos metade dos casos, foram realizadas ressecções concomitantes de outros órgãos e/ou estruturas abdômino-pélvicas. Em estudo retrospectivo prévio, nosso grupo avaliou 45 pacientes com média de idade de 58 anos submetidos a cirurgias de ressecção alargada por câncer colorretal localmente invasivo, encontrando uma sobrevida global média de 32 meses2. O fator determinante do prognóstico nesses casos foi a presença de acometimento linfonodal e não a invasão contígua de outras vísceras ou a idade dos pacientes, o que justifica plenamente a realização de cirurgias alargadas no tratamento de neoplasias colorretais localmente avançadas, sobretudo em pacientes jovens, como os da presente série.
    Além da invasão de outros órgãos e estruturas em 50% dos casos, havia implantes peritoneais em 2 pacientes (25%) e metástases hepáticas em outros dois casos (25%), já na primeira cirurgia, evidenciando doença bastante avançada ao tratamento inicial, o que também foi relatado por outros autores 1,4,6,9,11,12,13,24.
    A taxa de recorrência em pacientes jovens com câncer colorretal costuma ser alta15. Rodriguez-Bigas et al18 relataram taxa de recorrência de 64,7% em pacientes portadores de CACR abaixo de 30 anos que foram submetidos à cirurgia potencialmente curativa. No presente estudo, a taxa de recorrência local foi de 25% e a taxa de recorrência à distancia de 37,5%, tendo ocorrido num tempo médio de 8,6 meses (variando entre 3 a 15 meses). As recorrências manifestaram-se principalmente por obstrução intestinal devido a carcinomatose peritoneal. Levando-se em conta também a carcinomatose peritoneal sincrônica, atinge-se uma taxa de 62,5% de acometimento difuso da membrana peritoneal por CACR no presente estudo, taxa bem mais elevada do que a publicada na literatura, que gira em torno de 10%7.
    O tempo de seguimento médio na presente casuística foi de 30,4 meses. Ocorreram 4 óbitos e houve perda de seguimento de um paciente. A sobrevida global média encontrada foi de 23,6 meses e a sobrevida livre de doença foi de 16,6 meses. A taxa de sobrevida global em 2 anos foi de 37,5%, sendo que a presente série é pequena para se avaliar a sobrevida por estágio da doença. Em revisão da literatura japonesa, Yamamoto et al24 encontraram uma taxa de sobrevida em 2 anos de 19,8% para pacientes com CACR abaixo de 20 anos. Lee et al9 relataram taxa de sobrevida em 5 anos para o estádio Dukes A modificado de 100%, e de 85%, 40% e 7% para os estádios B, C e D, respectivamente.
    No estudo de Rodriguez-Bigas et al18, 79,4% dos pacientes (54 em 68) foram a óbito pela doença em acompanhamento médio de 21,5 meses, sendo que 82% foram classificados como estadios III ou IV ao diagnóstico. Esses autores consideraram que, em pacientes com CACR abaixo de 30 anos de idade, o estágio do tumor primário e a recorrência foram as únicas variáveis per se, associadas à sobrevida.
    No entanto, Barillari et al3 não encontraram diferença na sobrevida global de 5 anos em pacientes com CACR abaixo de 40 ou acima de 40 anos de idade. Da mesma forma, observou-se que pacientes jovens com CACR apresentam uma sobrevida estadio-relacionada similar àquela de pacientes mais idosos com a doença6,11.

CONCLUSÕES
Pacientes com CACR abaixo de 30 anos de idade são usualmente bastante sintomáticos e têm doença avançada ao diagnóstico. É provável que a baixa incidência de câncer colorretal observada em pacientes jovens leve os médicos a firmarem outros diagnósticos a princípio. Isso, associado ao fato do paciente jovem tender a protelar a procura por assistência médica, pode contribuir para que a confirmação diagnóstica ocorra tardiamente, já com doença avançada loco-regionalmente e à distância. Além disso, a maioria desses tumores pode ser considerada, histologicamente, de comportamento mais agressivo, o que também contribui para que o prognóstico do câncer colorretal, em pacientes com idade inferior a 30 anos, tenda a ser pior.

SUMMARY: Controversy exists about the prognosis of the colorectal cancer (CRC) in young patients. It is supposed that younger patients have more aggressive locally tumors and with increased capacity of dissemination when compared to the older people with CRC. Our objective was to evaluate CRC in eight patients under 30 years of age, emphasizing the presentation and evolution of the disease. We have retrospectively studied 8 cases of adenocarcinoma of colon and rectum treated and followed at our institution between 1997 and 2002 from a total of 334 patients with CRC (2.39%). The proportion male/female was of 3:1 with an average of 25 years of age (ranging from 21 to 29). The most common presenting symptoms were changing of the intestinal habit and weight loss. Family history was present in two cases. The average time lasted from the onset of symptoms until the diagnosis of the disease was 10 months. Half of patients underwent surgery on urgency setting. Most of the lesions were found in the rectosigmoid and cecum (75%), being observed invasion of the serosa in 87.5% of them. In relation to the histology, 50% of the tumors were classified as poorly differentiated. The mean follow-up was of 30.4 months. The global mean survival was of 23.6 months. The mean survival free of disease was 16.6 months. Four deaths occurred and there was loss of follow-up in one patient. Young patients under 30 years of age with colorectal cancer (CRC) are usually very symptomatic, having advanced disease at the diagnosis with tendency to poor prognosis.

Key words: colorectal cancer, cancer, young patients

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Endereço para correspondência:
Antônio Lacerda-Filho.
Instituto Alfa de Gastroenterologia.
Hospital das Clínicas da UFMG
Av. Prof. Alfredo Balena nº 110, 2º andar - Santa Efigênia
30130-100 - Belo Horizonte (MG)

Trabalho realizado pelo Grupo de Coloproctologia e Intestino Delgado e Serviço de Patologia do Instituto Alfa de Gastroenterologia. Hospital das Clínicas-UFMG.