ARTIGOS ORIGINAIS
MARISTELA GOMES DE ALMEIDA - TSBCP
DANIELLE CAMPOS SANTIAGO ROLIM
FLÁVIA LEMOS MOURA RIBEIRO
PAULA MOURA MENDONÇA
ANTÔNIO CARLOS.BARAVIERA - TSBCP
TEREZA DE CARVALHO VILARIÑO - TSBCP
RÉGIS MIKAIL ABUD
VINÍCIO FALLEIROS
ENZO FABRÍCIO RIBEIRO NASCIMENTO
JOSÉ ANTÔNIO VOLPIANI - FSBCP
RESUMO: Objetivo: Avaliar os resultados cirúrgicos do tratamento de doença hemorroidária e prolapso mucoso do reto pela técnica de Longo, observando-se a altura da sutura em bolsa e do grampeamento, complicações e seguimento pós-operatório. Casuística e Método: Estudaram-se prospectivamente 30 doentes operados no Serviço de Coloproctologia do Hospital do Servidor Público Municipal de São Paulo, no período de setembro de 2002 a julho de 2003. A média de idade foi de 47,9 anos, sendo 21 doentes do sexo feminino e 09 do sexo masculino. Resultados: O tempo médio de cirurgia foi de 19,1 minutos. A altura do grampeamento ficou em média 2,7 cm acima da linha pectínea, observando-se que, quando o grampeamento situava-se a menos de 2 cm da linha pectínea, a dor referida pelos doentes era significantemente mais freqüente. Treze doentes (43,3%) necessitaram de pontos hemostáticos após o grampeamento, com média de 1,6 pontos/doente. Entre o 1° e o 7° dia pós-operatório, três doentes (10%) apresentaram sangramento anal volumoso, havendo necessidade de revisão cirúrgica em 2 casos. Nenhum deles precisou de transfusão sanguínea. Ainda neste período, quatro doentes (13,3%) referiram dor anal intensa, dois (6,6%) evoluíram com trombose hemorroidária externa e dois (6,6%) com fissura anal aguda, com boa resposta ao tratamento clínico instituído. O seguimento pós-operatório médio foi de 8,4 meses, quando 96,7% dos doentes encontravam-se assintomáticos. Conclusão: Conclui-se que se trata de técnica eficiente, pouco dolorosa para a maioria dos doentes (86,7%), havendo relação direta da dor com a altura do grampeamento.
Unitermos: hemorróidas, prolapso mucoso retal, grampeamento circular
INTRODUÇÃO
O tratamento cirúrgico da
doença hemorroidária tem sido considerado
procedimento doloroso, causando sofrimento no pós-operatório
e afastamento dos pacientes por tempo prolongado
de suas atividades habituais.
A causa mais provável desta dor seria
a realização de feridas acometendo a pele perianal e
do canal anal, áreas extremamente sensíveis e
que desencadeiam dor pelo trauma da passagem do
bolo fecal 1 . Isto explicaria então, a grande variedade
de técnicas cirúrgicas para o tratamento da doença
que, em última análise, têm como objetivo diminuir a
dor pós-operatória.
Recentemente, Longo 2 descreveu
técnica cirúrgica para doença hemorroidária interna e
prolapso mucoso do reto, que consiste em realizar
grampeamento mecânico circular da mucosa retal acima dos
mamilos hemorroidários, restabelecendo a anatomia do
canal anal, recolocando os plexos hemorroidários em
sua posição habitual e ressecando o excesso de mucosa
retal acima dos mesmos. Por não atingir a pele perianal,
o procedimento seria indolor e permitiria retorno
mais rápido ao trabalho.
Assim, o objetivo deste estudo foi avaliar
os resultados cirúrgicos da doença hemorroidária,
tratada pela técnica de Longo (PPH), descrevendo
as indicações mais freqüentes, complicações e
evolução no pós-operatório com relação a dor, altura
do grampeamento e uso de analgésicos.
CASUÍSTICA E MÉTODO
Casuística
Foram operados 30 doentes, utilizando-se a técnica de Longo, no Serviço de Coloproctologia
do Hospital do Servidor Público Municipal de São
Paulo, no período de setembro de 2002 a julho de 2003,
sempre pelo mesmo cirurgião e equipe cirúrgica.
Destes pacientes, 21 eram do sexo feminino e 09 do sexo masculino, com média de idade de
47,9 anos (27 a 77 anos). As indicações cirúrgicas
foram prolapso mucoso em 9 pacientes (30%),
hemorróidas internas de terceiro grau com prolapso e
sangramento em 11 pacientes (36,6%) e sangramento anal em
10 pacientes (33,3%).
Método
Todos os pacientes, previamente ao ato cirúrgico, foram submetidos à limpeza mecânica do
reto com enema de fosfato de sódio.
Realizou-se raquianestesia e antibioticoprofilaxia ( dois gramas
de cefalotina por via endovenosa, após realização
da anestesia). O doente era colocado em posição
de litotomia, de acordo com a técnica preconizada. Para
a sutura em bolsa utilizou-se fio monofilamentar inabsorvível 2.0 e agulha circular de 2 cm,
incluindo mucosa e submucosa do reto, realizada entre 3 e 6
cm acima da linha pectínea.
Em seguida introduziu-se o grampeador aberto, fazendo a ogiva ultrapassar a sutura
circular, fixando-se a mucosa sobre a ogiva pela amarradura
do fio. As pontas do fio foram passadas pelos
orifícios laterais do grampeador para tração da mucosa
enquanto se fechava progressivamente o aparelho. Nas
pacientes do sexo feminino, a parede posterior da vagina
foi pinçada e tracionada com pinça de Allis para
evitar seu acometimento durante o grampeamento.
Utilizou-se o Kit Ethicon PPH01Ò (Ethicon Endosurgery).
Após a retirada do grampeador, caso fossem
encontrados pontos de sangramento na linha de grampos, os
mesmos eram submetidos a hemostasia com pontos de
prolene 3.0. Finalmente, realizava-se curativo hemostático
com gelatina especial. Todos os pacientes ficaram
internados por 24 horas, recebendo alta no dia seguinte ao
da cirurgia.
No pós-operatório imediato a analgesia
foi feita com dipirona sódica ( 2cc endovenoso de
6/6 horas) e diclofenaco sódico (75 mg intramuscular
de 12/12 horas). Antibióticos foram prescritos por
um período de oito dias após a cirurgia. Os doentes
foram examinados nos 1°, 7º, 15º, 30º dias de pós
operatório e entre dois meses a um ano após a cirurgia. Durante
a consulta foram questionados quanto à intensidade
de dor no respectivo dia de pós operátorio, sendo
agrupados em uma escala de dor que ia de zero a dez,
na qual zero correspondia a ausência de dor e
dez correspondia a dor intensa. Os doentes foram
divididos em três grupos, de acordo com a dor referida:
ausente ou leve (0-3), moderada (4-6) e intensa (7-10).
RESULTADOS
A altura do grampeamento ficou, em
média, 2,7 cm acima da linha pectínea e o tempo médio
de cirurgia foi de 19.1 minutos (variando de 15 a
35 minutos). Treze doentes (43.3%) necessitaram de pontos hemostáticos (em média 1,6
pontos/doente) após o grampeamento e retirada do aparelho. No primeiro dia pós-operatório, 73,3%
dos doentes apresentaram dor, variando de leve a
moderada e 26,7% referiram dor intensa. Nos retornos
seguintes, o percentual de pacientes assintomáticos
aumentou significantemente, observando-se que a maioria
dos doentes não apresentava dor ou esta era de
leve intensidade após o 15° dia pós-operatório (Tabela
e Gráfico-1).
Tabela e Gráfico 1 - Escala de dor referida
pelos doentes até 30 dias após a cirurgia.
Escala da Dor | 1º PO | 15º PO | POT |
Ausente/Leve (0-3) | 56,7 | 86,6 | 96,7 |
Moderada (4-6) | 16,6 | 13,4 | 3,3 |
Intensa (7-10) | 26,7 | 0 | 0 |
Gráfico 1 |
Sintomas dolorosos foram significantemente mais freqüentes(p=0,05) naqueles doentes cuja linha de grampeamento estava até 2 cm acima da linha pectínea (55,6 % dos casos) (Tabela-2).
Tabela 2 - Correlação entre altura do grampeamento e dor no
1°dia pós-operatório.
Dor | Total | ||||
Ausência | Presença | ||||
Altura do Grampeamento | Até 2,0cm acima da linha pectínea |
Casos |
8 | 10 | 18 |
% |
44,4% | 55,6% | 100,0% | ||
Mais de 2,0cm acima da linha pectínea |
Casos |
11 | 1 | 12 | |
% |
91,7% | 8,3% | 100,0% | ||
Total |
Casos |
19 | 11 | 30 | |
% |
63,3% | 36,7% | 100,0% | ||
Teste de Fischer (p= 0,018) |
O estudo anatomo-patológico das
peças mostrou que em 27 casos a camada muscular
própria estava presente nos espécimes estudados.
No pós-operatório precoce (até 7 dias
após a cirurgia), quatro doentes (13,3%) necessitaram
de analgesia complementar devido a dor persistente.
Dois doentes apresentaram trombose hemorroidária
externa aguda (6,6%) e dois (6,6%) fissura anal aguda,
todos tratados clinicamente, com boa evolução.
Sangramento anal volumoso ocorreu em
três doentes (10%), havendo necessidade de
revisão cirúrgica em dois casos. Nenhum deles precisou
de transfusão sanguínea.
O seguimento pós-operatório médio foi
de 8,4 meses, quando 94.7% dos doentes
encontravam-se assintomáticos e apenas um deles referia
persistência de discreto sangramento anal às evacuações dois
meses após a cirurgia.
DISCUSSÃO
A hemorroidectomia convencional
através de técnicas excisionais, tais como Milligan-Morgan
3 ou Ferguson4, são aceitas como as mais efetivas para
o tratamento das hemorróidas de 3º e 4º graus,
em comparação a outras técnicas como ligadura
elástica, coagulação com infravermelho, crioterapia e
excisão a laser 5. A anopexia por grampeamento representa
uma nova opção no tratamento de hemorróidas e
prolapso mucoso retal, restaurando a anatomia normal do
canal anal e diminuindo o trauma cirúrgico endoanal e
da pele perianal. O método foi primeiramente descrito
por Longo em 1993, sendo largamente utilizado no continente europeu, onde, até o ano 2000, já
haviam sido realizadas 50.000 cirurgias
6. Na América Latina, até julho de 2002, 1180 doentes foram operados
por esta técnica(7).
Ganio et al.(1), em estudo
randomizado, comparando a hemorroidectomia por
grampeamento com as realizadas pela técnica de
Milligan-Morgan, mostraram que ambas foram igualmente efetivas
no tratamento das hemorróidas de 3º e 4º graus. O
número de complicações pós-operatórias foram
comparáveis, bem como a satisfação dos pacientes após um ano
de acompanhamento. Com relação à dor, observaram
que o PPH oferece maior bem estar pós-operatório e,
como conseqüência, retorno mais rápido às
atividades habituais.
Khalil et al.(2000)5 observaram
menor tempo cirúrgico, menor necessidade de analgesia
pós-operatória e retorno precoce às atividades habituais
na técnica com grampeador, comparando o
grampeamento com a técnica de Ferguson.
Fibras musculares foram encontradas na maioria dos espécimes submetidos a
exame histopatológico, semelhante ao que também foi
relatado por outros autores 5,8. Entretanto, nenhum dos
pacientes referiu incontinência anal no período observado.
Ho et al.9 referiram que o uso do
dilatador anal aumentou o risco de injúrias
esfincterianas, evidenciadas por ultrassonografia endoanal,
podendo levar a futuras alterações de continência anal.
No presente estudo, observou-se que a
altura do grampeamento influenciou decididamente
na intensidade de dor pós-operatória, fato também
descrito por Habr-Gama et al (2003)7 que relataram
a experiência inicial de um grupo da América Latina
com 177 doentes operados por esta técnica.
As complicações pós-operatórias
que ocorreram neste estudo são semelhantes às
descritas na literatura7,10-15, sendo na maioria de fácil
resolução. Dois doentes apresentaram hemorragia volumosa
no 7º dia pós-operatório, sendo submetidos a exame
sob narcose, com identificação de vários pontos
de sangramento, um deles apresentando distúrbio
de coagulação, não existente no pré-operatório. Esta é
sem dúvida a complicação mais temida, cuja
incidência tende a ser minimizada pela revisão rigorosa da
linha de grampeamento, experiência adquirida e
mais recentemente pelo uso de aparelhos com
grampos vasculares.
Alguns fatores podem dificultar a
realização desta técnica. No presente estudo, considerou-se
a realização de hemorroidectomia prévia como
fator limitante, que dificulta ou não permite a colocação
do dilatador anal. Nos casos iniciais desta série, a
não colocação do dilatador impedia a realização da
cirurgia. Com a experiência adquirida, percebeu-se que
é possível realizar a sutura em bolsa apenas com
o afastador meia-cânula interno, o que amplia a
possibilidade de utilização do procedimento. Outro
fator limitante seria a presença de mamilos
hemorroidários internos volumosos, dificultando a realização da
sutura em bolsa. Pode-se contornar este empecilho pela
tração ou afastamento dos mesmos pelo auxiliar da
cirurgia, melhorando a visualização da mucosa retal. No
geral, são limitações que necessitam de uma curva
de aprendizado para superá-las.
CONCLUSÃO
Conclui-se neste estudo que a técnica
de Longo é eficaz quando bem indicada, sendo
bem tolerada e dispensando analgesia complementar
na maioria dos doentes. Observou-se ainda que
trata-se de técnica segura, com baixa incidência
de complicações e que a dor referida está relacionada
com a altura do grampeamento.
Agradecimentos:
À Superintendência do Hospital do Servidor Público
Municipal de São Paulo, por disponibilizar permanentemente
os instrumentos necessários (PPH) para a realização desta técnica.
SUMMARY: Aim: The aim of this study was to evaluate the surgical outcome on the treatment of third degree internal
hemorrhoids and rectal mucosal prolapse by Longo technique. The level of suture and stapler on the rectum, complications and
postoperative follow-up were observed. Patients and Method: 30 patients treated by Longo operation were prospectively studied from
September 2002 to July 2003, at the Coloproctology Department of Hospital do Servidor Público Municipal de São Paulo. The mean age
was 47.9 years, 21 patients were female and 9 were male. Results: The average time of surgery was 19.1 minutes. The average level of
the stapler line was 2.7 cm above the dentate line. It was also observed that pain was more frequent when the stapler line was lower
than 2.0 cm above the dentate line. Thirteen patients (43.3%) additionally required sutures for hemostasis; the average was 1.6
sutures per patient. Between the first and the seventh postoperative day, 3 patients (10%) had severe anal bleeding, and in two cases
a surgical revision of hemostasis was performed. None of them required blood transfusion. Four patients (13.3%) presented
severe anal pain; two (6.6%) presented thrombosis of the external hemorrhoidal plexus and two (6.6%) had an acute anal fissure.
The average postoperative follow-up was 8.4 months. 96.7% of the patients are asymptomatic. Conclusion: This study supported
that Longo operation was an efficient method, not much painful for majority of patients (86.7%), and that there was a
significant correlation between pain and the level of the stapler line.
Key words: hemorrhoids, rectal mucosal prolapse, circular stapler.
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Endereço para correspondência:
Maristela Gomes de Almeida
Rua Dr. Bacelar, 173- Conj. 103 - Vila Clementino
04.026-000 - São Paulo ( SP)
Fone/Fax: (11) 5083-3964
E-mail: dramgalmeida@uol.com.br
Trabalho realizado no Serviço de Coloproctologia do Hospital do Servidor Público Municipal de São Paulo.