ARTIGOS ORIGINAIS


LIMITAÇÕES E DETALHES TÉCNICOS DO ULTRA-SOM ENDO-ANAL NO DIAGNÓSTICO DE AFECÇÕES BENIGNAS E MALIGNAS NO CANAL ANAL

STHELA MARIA MURAD REGADAS -TSBCP
FRANCISCO SÉRGIO PINHEIRO REGADAS -TSBCP
LUSMAR VERAS RODRIGUES -TSBCP
RUBENS DE WEIMAR CHAVES
CAMILA DE MELO MATOS LIMA
LIVIA ARIANE LOPES


REGADAS SMM; REGADAS FSP; RODRIGUES LV; CHAVES RW; LIMA CMM; LOPES LA. Limitações e Detalhes Técnicos do Ultra-Som Endo-Anal no Diagnóstico de Afecções Benignas e Malignas no Canal Anal. Rev bras Coloproct, 2004;24(3):230-239.

RESUMO: O objetivo deste trabalho é demonstrar, de forma prática e objetiva, as limitações e enfatizar os detalhes técnicos do ultra-som endo-anal visando indicar adequadamente o exame e reduzir os erros no diagnóstico das afecções benignas e malignas no canal anal. O ultra-som é portanto um exame com limitações e dificuldades técnicas e sua eficácia relaciona-se com a correta indicação e experiência do examinador.

Unitermos: Ultra-som, Änus, Canal anal

INTRODUÇÃO
O ultra-som (US) bidimensional convencional com transdutor de 360°, rotatório com comprimento focal de 2 a 5 cm e frequências de 7 a 10 mmHz desenvolvido para o exame anorretal possibilita avaliação anatômica do canal anal, reto e tecidos perianais e perirretais no plano axial com as imagens projetadas radialmente ao eixo do transdutor, visualizando as alterações em relação a circunferência anorretal e a extensão lateral superficial dos tecidos. Também pode localizar em relação a margem anal. No entanto, não define o comprimento longitudinal da lesão. Já, a ressonância nuclear mágnetica (RNM) avalia nos três planos (axial, coronal e sagital) e com desenvolvimento da bobina anorretal possibilita a distinção das camadas da parede anorretal. Da mesma forma, o ultra-som tridimensional, que a partir do corte original axial produz a reconstituição volumétrica em múltiplos planos (axial, sagital e coronal) avaliando simultaneamente nas extensões transversal (radial) e longitudinal, possibiltando até seis diferentes e especializadas projeções, visualizando as alterações em diferentes ângulos1,2. No entanto, as informações obtidas a partir do ultra-som bidimensional quando interpretadas associando aos achados clínicos possibilitam orientar e/ou esclarecer o diagnóstico e a escolha da terapêutica adequada.
    O objetivo deste trabalho é demonstrar, de forma prática e objetiva, as limitações e enfatizar os detalhes técnicos do ultra-som endo-anal visando indicar adequadamente o exame e reduzir os erros no diagnóstico das afecções benignas e malignas no canal anal.

Aspectos técnicos e anatômicos do ultra-som do canal anal
O paciente é orientado realizar "fleet enema" duas horas antes do exame pela possibilidade de realizar-se simultaneamente o ultra-som do reto. A posição mais freqüentemente utilizada é em decúbito lateral esquerdo. No entanto, alguns autores orientam a mudança de posição para o decúbito ventral quando são visualizadas alterações na simetria da musculatura esfincteriana, simulando lesão muscular. Esta alteração pode ser atribuída à perda de contato acústico com o transdutor no lado direito pela ação da gravidade devido à posição lateral esquerda adotada. Também possibilita melhor visualização do períneo3,4. Durante o exame, é possível alterar o ganho de imagem, definindo e visualizando melhor os tecidos. É possível intensificar o retorno do eco, fazendo aparecer mais evidente a imagem hiperecoica (clara) no monitor, ou reduzir o retorno do eco, tornando-se mais evidente a imagem hipoecoica (escura). No canal anal, a camada adjacente ao transdutor corresponde a mucosa-submucosa (hiperecoica) que quando apresenta-se espessada, sugere prolapso mucoso-hemorroidário nos indivíduos sem neoplasia maligna no canal anal (Figura-1). Os esfincteres anal interno (EAI) e externo (EAE) distribuem-se de forma circular no canal anal. Por sua vez, o EAI é evidenciado no canal anal superior e médio e o EAE no médio e inferior sendo dividido em três partes (profunda, superficial e subcutânea). Já o músculo pubo-retal (PR), no canal anal superior, apresenta-se com a forma em "U", com suas fibras contornando posteriormente o reto e dirigindo-se lateralmente no sentido superior do monitor. Dessa forma, o quadrante anterior apresenta-se desprovido de fibras musculares. A presença de diferença na espessura dos ramos do pubo-retal (assimetria) pode ser devido a posição do transdutor, do paciente (lateral esquerdo) ou variação anatômica. No entanto, o examinador deve estar apto para reconhecer lesão muscular, demonstrada através da mudança na ecogenicidade do músculo no local lesado (Figura-2a,b). É freqüentemente possível identificar-se o músculo longitudinal que é visualizado como delgada imagem hipoecoica localizada no espaço inter-esfinctérico. Entre o EAI e o músculo longitudinal, pode observar-se uma imagem hiperecoica correspondente a tecido conjuntivo (Figura-3). Também pode ser visualizado o músculo transverso do períneo (TP) que corresponde a imagem hipoecoica cruzando as fibras do EAE, na porção anterior, e projetando-se na posição de 11 e 1 h (Figura-3). Essa imagem interpondo-se entre as fibras do EAE pode eventualmente dificultar a identificação da sua borda lateral5 . O US quantifica com precisão a espessura do EAI (varia de 1,5 a 4mm) pois este músculo apresenta-se com contornos bem definidos. Por sua vez, a espessura eleva-se com a idade, devido o aumento do volume do músculo pela substituição de fibras musculares funcionais por tecido fibroso, tornando mais ecogênico e com a textura não-homogênea6,7. No entanto, quando ultrapassa 3,5mm, principalmente em pacientes jovens, pode ser considerado como hipertrofia. Ocorre em doenças raras como a miopatia familiar e a displasia intestinal neuronal. Marshall e cols associaram os achados de úlcera solitária e hipertrofia do EAI com intussuscepção interna alta8. Já a redução na sua espessura pode ser evidenciada em pacientes incontinentes, na degeneração primária do EAI e após anastomose íleo-anal3,9 . Quanto ao EAE e PR, apresentam contornos indefinidos, impossibilitando a identificação precisa dos seus limites externos com relação ao tecido adjacente (gordura perianal e ísquio-retal) pois ambos emitem intensidade de ecos semelhante. Além disso, as medidas do EAE pode estar incluindo o músculo longitudinal, nos casos de dificuldade em identificá-lo claramente. Há estudos comparando a precisão do US e da RNM com bobina endo-retal em medir as espessuras musculares, constatando-se precisão nas medidas de ambos os esfincteres anais com a RNM10.
    O exame também possibilita avaliar superficialmente o tecido peri-anorretal (isquio-retal e supra-elevador) e o corpo perineal.

 

Figura 1 - Prolapso mucoso-hemorroidário-Espessamento da mucosa-submucosa ântero-lateral esquerdo (Imagem hiperecoica) AEI- Hipoecoico/ EAE-Ecogenicidade mista


 

Figura 2a - Assimetria do pubo-retal. Ramo lateral esquerdo com menor espessura. b - Lesão do pubo-retal lateral direito entre 6 e 9h. Mudança na ecogenicidade no local da lesão (setas)


 

Figura 3 - Músculo longitudinal (ML) no espaço inter-esfinctérico (Imagem hipoecoica) - Tecido conjuntivo (TC) entre o EAI e músculo longitudinal (imagem hiperecoica) - Transverso do períneo (TP) na projeção de 11 e 1 h e cruzando o EAE (hipoecoica).

 

Incontinência Fecal
O US demonstra a extensão da lesão em relação à circunferência anal, identifica o(s) músculo(s) lesado(s) e diferencia a lesão parcial da completa. Também avalia os resultados pós-operatórios. As diferenças morfológicas entre os esfincteres anais podem produzir interpretações ultra-sonográficas diferentes entre examinadores ou até o diagnóstico de falso positivo. Dentre essas, o comprimento do EAE é menor no quadrante anterior, no sexo feminino. Na porção profunda do EAE, suas fibras estão ausentes anteriormente, sendo evidenciada circularmente na porção superficial e subcutânea do músculo51,3,6,7,11,12. Essa assimetria observada pelo ultra-som bidimensional, com imagem axial (circular), evidencia-se pela ausência anatômica de fibras do EAE no quadrante anterior na transição com o PB e na sua porção profunda. Há sinais para diferenciar ausência anatômica do EAE de lesão adquirida. Quando a lesão muscular é adquirida, as bordas lesadas são irregulares, visualizando-se imagem de ecogenicidade mista entre elas, podendo encontrar-se em posição acima e/ou abaixo de 1,5 cm da margem anal e estar associada à lesão do EAI13,14 (Figura-4a,b). As alterações anatômicas ocorridas após partos por via vaginal e traduzidas pela presença de fibrose próximo à local da episiotomia ou laceração perineal, podem também dificultar a identificação da borda lateral do EAE e a presença de lesão parcial15. Já Frudinger e cols demonstraram redução na espessura do EAE no quadrante anterior e espessamento nos quadrantes laterais evidenciado no canal anal inferior devido alterações no alinhamento da porção superficial e subcutânea do EAE, associado ao espessamento do músculo longitudinal possivelmente resultante do estiramento durante o parto16 . Zetterström e cols sugerem a medida do corpo perineal determinada pela distância entre o dedo do examinador posicionado na parede posterior da vagina e a superfície interna do EAI e demonstraram que medidas abaixo de 10mm associam-se à lesão muscular (Figura-4b). Relatam ainda que a presença do dedo na parede posterior da vagina pode melhorar a visualização da porção anterior do canal anal pois produz diferença na impedância acústica dos tecidos, modificando o eco e tornando a imagem correspondente à lesão mais hipoecoica, o que possibilita identificar melhor a extremidade dos músculos lesados (hiperecoica)17. Já Sudol-Szopinska preconiza que a pressão do dedo na vagina também retifica o canal anal, modificando a posição do raio obliquamente inclinado para a posição perpendicular, resultando em ecos mais curtos e imagens bem definidas18. Portanto, nas pacientes submetidas a perineoplastia, essa avaliação pode ser inconclusiva demonstrando medida do corpo perineal normal mesmo na presença de lesão muscular já que nesse procedimento é corrigido o septo ano-vaginal sem o devido reparo de eventual lesão muscular esfincteriana. Em relação ao quadrante posterior, o ligamento ano-coccígeo pode produzir imagem hipoecoica no EAE e simular lesão muscular3,19.20 (Figura-5). Rieger e cols. demonstraram melhor visualização da lesão esfincteriana durante a contração muscular em 62% dos casos21 embora Frindger e cols. mencionem que não observaram qualquer diferença4. Vários estudos têm demonstrado elevada prevalência de lesões musculares identificadas pelo ultra-som em pacientes continentes ou com sintomas de incontinência após parto vaginal. Por isso, o exame apresenta elevada sensibilidade e especificidade para diagnosticar lesão esfincteriana e baixa especificidade para incontinência fecal22-24. Dessa forma, os pacientes com sintomas de incontinência e diagnóstico de lesão muscular devem ser adequadamente avaliados com relação ao tipo do dano responsável pelos sintomas. O US pode ser também utilizado no diagnóstico de lesão muscular oculta em pacientes submetidas a parto vaginal traumático e/ou procedimentos cirúrgicos proctológicos com indicação para submeterem-se a nova intervenção cirúrgica na região ano-reto-perineal visando evitar dano cumulativo25-29.

 

Figura 4a - Ausência de EAE no quadrante anterior do canal anal médio (variação anatômica normal) b - Lesão completa do EAE no quadrante anterior, entre10 e 3h. associada a lesão do EAI entre 12 e3h (Bordas irregulares - setas).


 

Figura 5 - Ligamento ano-coccígeo- Imagem hipoecoica no quadrante posterior simulando lesão muscular (setas)

 

Abscessos ano-retais
Quando a introdução do transdutor não é tolerado pelo paciente mas o exame é importante para a confirmação diagnóstica e planejamento do tratamento, o US pode ser realizado sob sedação anestésica ou durante o procedimento cirúrgico já que o aparelho é facilmente transportável. Possibilita demonstrar com clareza o tamanho e relação da cavidade do abscesso com os músculos esfincterianos. Também evidencia abscesso ainda em formação com diagnóstico duvidoso ao exame proctológico. Nos casos de dor ano-retal persistente com suspeita clínica de abscessos submucosos, intermuscular alto e pelve-retal, faz-se necessário avaliação ultra-sonográfica do reto e tecido perirretal. A técnica desse exame consiste no posicionamento de um balão ou outro dispositivo em torno do transdutor, insuflando-o com água destilada, possibilitando desta maneira o contato do transdutor com as paredes do reto. Dessa forma, os abscessos submucosos ou intermuscular alto são identificados em 100% dos casos (Figura-6). Possibilita ainda a realização da drenagem com agulha orientada pelo US e seguimento após o tratamento instituído, seja clínico ou cirúrgico30,31. Já no abscesso pelve-retal, a tomografia computadorizada (TC) constitui-se no exame de escolha para avaliação de sua extensão na pelve32,33. No entanto, o US pode ser útil na identificação de sua relação com a parede do reto (Figura-7).
    Pode não ser possível a visualização do limite lateral do abscesso isquio-retal ou toda sua extensão através do US quando localizado profundamente, além da penetração do transdutor. O exame pode ser inconclusivo na síndrome de Fournier devido à destruição excessiva dos músculos com formação de tecido fibrótico.

 

Figura 6 - Abscesso submucoso (imagem hipoecoica entre a muscular da mucosa e submucosa do quadrante lateral direito).


 

Figura 7 - Abscesso pélvico (Imagem hipoecoica anterior sem envolvimento da parede do reto). Não é possivel visualizar os limites superior e laterais

 

Fístulas ano-retais
É importante a identificação de coleção adjacente, orifício interno, trajeto primário e/ou secundário(s), e avaliação da integridade anatômica dos músculos, sobretudo nas fístulas complexas, possibilitando orientar o tratamento cirúrgico no sentido de reduzir os riscos de recidiva e incontinência fecal. Os estudos demonstram que 20 a 30% das recidivas ocorrem devido a não identificação do(s) trajeto(s) secundário(s) e 32 a 53 % do orifício interno34-36. O trajeto fistuloso é ecograficamente representado por imagem hipoecoica. Essa imagem localiza-se ao lado do EAI na fístula inter-esfinctérica ou cruzando o EAE na fístula trans-esfinctérica (Figura-8a,b). Em geral, não é possível diferenciar o trajeto primário de um secundário37. É importante o ultra-sonografista estar atento em diferenciar o músculo longitudinal de um trajeto fistuloso inter-esfinctérico (Figura-9a,b). Já na identificação do orifício fistuloso interno foram propostos critérios, tais como imagem hipoecoica na mucosa-submucosa, correspondendo a sua completa rotura; imagem hipoecoica inter-esfinctérica (entre um trajeto fistuloso inter-esfinctérico e o EAI) e defeito no esfíncter anal interno (na ausência de esfincterotomia prévia) (Figura-8b). Baseando-se nestes critérios, a identificação tem sido eficaz em 80,0% dos casos37,38. Nas fístulas extra-esfinctéricas, a identificação do orificio interno no reto só é possível utilizando-se a técnica do US endo-retal. O orificio interno é identificado com maior precisão utilizando-se a freqüência de 10 MHz pois proporciona menor distância focal (penetração superficial) 33. Na tentativa de identificar melhor os trajetos fistulosos, orifício interno e cavidades adjacentes, são utilizados contrastes. A solução é injetada através de um cateter fino de polietileno introduzido pelo orificio externo. O exame deve ser realizado antes e após a injeção do contraste quando normalmente o trajeto e/ou cavidade são melhor visualizados, confirmando os achados anteriores e/ou demonstrando outras alterações (Figura-9a, b). Cheon e cols utilizaram água oxigenada e observaram que as imagens anteriormente hipoecoicas passam a ser hiperecoicas devido ao aumento da ecogenicidade provocada pelas bolhas de ar, melhorando a eficácia do exame39. Navarro-Luna e cols sugeriram a introdução de água oxigenada em duas etapas; injeção inicial pequena de um ml, seguida de injeção sob pressão, demonstrando excelentes resultados na identificação de trajetos fistulosos primário e secundário, orifício fistuloso interno e cavidades crônicas40. Di Nardo e cols. injetaram solução salina pelo orifício fistuloso e realizaram US com doppler colorido, demonstrando semelhança nos achados operatórios em todos os casos41. Chew e cols. propuseram o uso do contraste LevovistÒ que consiste de microparticulas de galactose e ácido palmítico. Demonstraram melhores resultados ao comparar com o exame clínico e o US sem contraste42.

 

Figura 8 a - Desenho esquemático da fístula trans-esfinctérica. Linha tracejada-corresponde ao local do corte transversal no US. b - Fístula trans-esfinctérica ântero-lateral direita. Imagem hipoecoica-cavidade lateral ao EAE.Trajeto Trans-esfinctérico (imagem hipoecoica cruzando o EAE e EAI). Orifício fistuloso às 12h.


 

Figura 9 - Fístula inter-esfinctérica. a - Imagem hipoecoica entre o EAE e EAI (sem H2O2). b - Imagem hiperecoica após injeção de H2O2 confirmando os achados (a), diferenciando do m. longitudinal.


    Existe maior dificuldade nas fístulas supra e extra-esfinctéricas. Também na interpretação de imagens em portadores de sepse prévia ou, reoperações devido ampla destruição anatômica requerendo experiência do ultra-sonografista. Quando o US for inconclusivo, a RNM (bobina endo-retal) é o exame de escolha. Quando comparados o US e RNM com os achados operatórios, os resultados demonstraram que a RNM foi superior na identificação de fistulas complicadas como a extra-esfinctérica e em trajeto secundário. Já os resultados foram semelhantes na identificação de trajeto primário em 86%, orifício fistuloso interno em 80%, fístula em ferradura em 94%43.
    Na fístula ano-reto-vaginal, a avaliação ultra-sonográfica pode evidenciar o trajeto fistuloso mas principalmente avaliar a integridade anatômica dos músculos esfincterianos visando melhor planejamento do tratamento cirúrgico para reduzir os riscos de recidiva e incontinência fecal44,45. O trajeto fistuloso é evidenciado por imagem hipoecoica cruzando o canal anal e/ou reto em direção a vagina

Neoplasia maligna do canal anal
O US é importante no estadiamento dos tumores malignos no canal anal no que concerne à invasão da musculatura esfincteriana e tecidos adjacentes, tornando-se parâmetro para seguimento após o tratamento com quimio e radioterapia46,47. Estudo multicêntrico demonstrou o elevado valor prognóstico do estadiamento ultra-sonógrafico dos tumores no canal anal quando comparado com sistema de estadiamento clínico baseado no tamanho da lesão48. A avaliação ultra-sonográfica do resultado do tratamento com radio e quimioterapaia deve ser realizada entre 8 a 16 semanas, podendo estender-se até 20 semanas, período em que está ocorrendo a regressão do edema e fibrose decorrentes da radioterapia47. Os exames devem ser realizados rotineiramente no seguimento pós-tratamento pois não é isoladamente eficaz no diagnóstico diferencial entre tumor residual e fibrose pós-radioterapia. No entanto, a seqüência de exames pode orientar adequadamente. As imagens evidenciadas nos exames de seguimento assemelham-se a lesão tumoral pré-tratamento mas os exames successivos demonstrarão a redução e desaparecimento destas imagens, traduzidas pela regressão do processo inflamatório/fibrótico e diferindo de lesão tumoral residual pois, nesta situação, as imagens permaneceriam com o mesmo tamanho ou ainda maiores. (Figura-10a,b,c). Os exames periódicos de controle possiblitarão o diagnóstico precoce de recidiva tumoral antes de identificadas pelo exame clínico, evitando biopsias excisionais desnecessárias49,50. Quando da suspeita de lesão residual ou recidiva pode orientar o local da biópsia ou realizá-la durante o exame.

 

Figura 10 - Seguimento de neoplasia na canal anal superior (PB) após radioterapia-Avaliação do resultado do tratamento. a - Neoplasia maligna no canal anal-pré-tratamento. b - Oito semanas pós-radioterapia (imagem hipoecoica no local da lesão). c - Doze semanas pós-radioterapia ( redução quase completa da imagem sugerindo edema e fibrose, afastando lesão residual.

Endometriose-
Perianal-
É visualizada como imagem hipoecoica ou de ecogenicidade mista. O US demonstra a extensão radial da lesão endometrial, as estruturas musculares e perineais infiltradas auxiliando na escolha da terapêutica (Figura-11). Pode não ser possível evidenciar o limite lateral da lesão quando infiltra tecidos adjacentes profundamente

 

Figura 11 - Endometriose perianal extensa-Imagem hipoecoica infiltrando o EAE na hemicircunferência direita e se extendendo antero-lateral direito em direção ao períneo sem visualização do limite lateral nessa localização(setas).


Retal- É necessário exame ultra-sonográfico do reto. Pode ser evidenciada imagem hipoecoica, extra-retal aderida ou infiltrando a parede do reto no septo reto-vaginal, orientando o planejamento cirúrgico (Figura-12).

Figura12 - Endometriose infiltrando a muscular própria da parede retal (Imagem hipoecoica extra-retal) (setas)



Cisto Pré-sacral _
O US ano-retal possibilita avaliar a relação da lesão com a parede retal e musculatura do assoalho pélvico. Também pode definir o tamanho e natureza da lesão. Ecograficamente, corresponde a imagem hipoecoica (na lesão cística) ou de ecogenicidade mista (na lesão sólida e mista), geralmente com contorno regular e sem aderência à parede do reto (Figura-13). Quando a neoplasia é volumosa pode não ser possível visualizar o limite lateral, sendo a TC ou RNM os exames de escolha para complementação diagnóstica.
    O US é portanto um exame de imagem que apresenta limitações e dificuldades técnicas e o índice de acerto está diretamente relacionado com a experiência do examinador e as condições em que são realizados.
 

Figura 13 - Cisto pré-sacral sem envolvimento da parede do reto (setas) (Imagem hipoecoica na região pré-sacral)

SUMMARY: The aim of the present paper is to objectively demonstrate the technical details of the anal ultrasound to dicrease the failure´s rate of diagnosis of the benign and malignant anal canal diseases. So, ultrasound is an exam with limitations and technical difficulties and it's efficacy is related to the correct indication and experience of the ultrasonographer.

Key words: Ultrasound, Anus, Anal canal

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Endereço para correspondência:
Sthela Maria Murad Regadas
Av. Edílson Brasil Soares, 1892
Edson Queiroz
60834-220 - Fortaleza - CE

Trabalho realizado no Centro de Coloproctologia e Gastroendoscopia do Ceará (Hospital São Carlos).