RELATO DE CASO


RESSECÇÃO DE METÁSTASE HEPÁTICA GIGANTE DE TUMOR COLÔNICO

JULIO CEZAR UILI COELHO - TSBCP
DANIELLE DUCK
CHRISTIANO MARLO PAGGI CLAUS


COELHO JCU; DUCK D; CLAUS CMP. Ressecção de Metástase Hepática Gigante de Tumor Colônico. Rev Bras Coloproct, 2004; 24(2): 262-265.

RESUMO: Hepatectomia é o tratamento de escolha de pacientes com metástases de carcinoma colorretal, devido à melhora da sobrevida a longo-prazo. Um homem de 29 anos de idade perdeu 14 kg em 3 meses. A tomografia abdominal mostrou um único tumor secundário de 17 cm no lobo hepático direito. A biópsia percutânea da lesão demonstrou tratar-se de um adenocarcinoma. A colonoscopia revelou um tumor grande do cólon transverso. O antígeno carcinoembriônico era de 4.273 ng/ml, o CA 19-9 de 4.759 UI/ml e a alfafetoproteína de 2,05 ng/ml. O paciente foi submetido a colectomia direita e a trissegmentectomia hepática direita. No pós-operatório evoluiu sem complicações. O tamanho da metástase hepática de um carcinoma colorretal não é contra-indicação para hepatectomia.

Unitermos: hepatectomia, colectomia, carcinoma colônico, metástase hepática.

INTRODUÇÃO
A ressecção hepática de metástases de câncer colorretal é a única forma de tratamento com potencial de cura.2 As indicações para ressecção cirúrgica permanecem controversas.2,4 A recorrência da doença desenvolve-se em dois terços dos pacientes submetidos a hepatectomia por metástases colorretais.4 A avaliação de fatores de risco pré-operatórios pode selecionar os candidatos a ressecção e predizer os resultados a longo prazo.9 O tamanho da metástase hepática proveniente de tumores colorretais é um fator prognóstico para recorrência e avaliação do comportamento biológico do tumor.3,6 O nosso objetivo é descrever um caso de metástase hepática gigante e única em um paciente jovem, submetido à colectomia por adenocarcinoma colônico.

RELATO DE CASO
Paciente masculino, 29 anos, apresentava queixa de febre e emagrecimento de 14 kg em 3 meses. Negava manifestações gastrointestinais. Ao exame físico apresentava-se emagrecido, relatando desconforto e dor à palpação do hipocôndrio direito e fígado palpável a 4 cm do rebordo costal direito. A tomografia computadorizada de abdome revelou a presença de uma lesão hepática gigante, de 17cm, ocupando todo o lobo hepático direito, com características de lesão metastática, sem comprometimento da veia porta e supra-hepáticas (Figura-1). A biópsia percutânea da lesão evidenciou adenocarcinoma. Prosseguindo a investigação foi realizada colonoscopia que revelou a presença de lesão vegetante e ulcerada em ângulo hepático do cólon transverso ocupando toda a circunferência da luz do órgão. A radiografia de tórax e a cintilografia óssea foram normais. A dosagem de marcadores tumores demonstrou antígeno carcinoembrionário de 4.273 ng/ml, CA 19-9 de 4.759 UI/ml e alfafetoproteína de 2,05 ng/ml.

 
Figura 1 - Tomografia computadorizada do abdômen mostrando tumor gigante em lobo hepático direito.



    O paciente foi submetido a laparotomia por incisão subcostal direita de 20cm. O ângulo hepático apresentava massa tumoral extensa, sem invasão de estruturas vizinhas. O tumor de lobo hepático direito era único, bem delimitado e não apresentava invasão das veias hepáticas, da veia porta e da veia cava. Confirmada a ressecabilidade das duas lesões e ausência de doença disseminada, a incisão foi prolongada tanto para a região subcostal esquerda como para a linha mediana em direção ao esterno (incisão em estrela de Mercedes Benz). Foram realizadas colectomia direita e trissegmentectomia direita (ressecção dos segmentos IV, V, VI, VII e VIII). Para a hepatectomia, foram inicialmente realizadas dissecção e ligadura das veias hepáticas direita e média. A seguir, o pedículo hepático foi dissecado e o ducto hepático direito, a artéria hepática direita, o ramo arterial para o segmento IV e o ramo direito da veia porta foram ligados e seccionados. O parênquima hepático foi seccionado 1 cm à direita do ligamento falciforme, após a realização da manobra de Pringle para reduzir perda sangüínea. Não foi realizada transfusão de hemoderivados e dreno de suctor foi colocado na região subhepática direita.
    O exame anátomo-patológico do cólon direito demonstrou a presença de adenocarcinoma colônico tubular, moderadamente diferenciado, de tamanho 7x5x1,7 cm e com comprometimento de um dos dezessete linfonodos ressecados. O tumor foi classificado como Dukes D (Classificação de Astler-Coller) pela presença de metástase à distância (hepática). O produto da trissegmentectomia pesava 3.600g e demonstrava tumor nodular metastático, único, bem delimitado, subcapsular, com 23x21x13cm (Figura-2). Pelo menos 2 cm das margens cirúrgicas não apresentavam neoplasia. O estadiamento patológico final do tumor foi T3 N1 M1.
    O paciente apresentou boa evolução pós-operatória, recebendo alta no 6º dia de pós-operatório sem complicações. Encontra-se atualmente assintomático, em tratamento adjuvante quimioterápico com 5-fluorouracil.

 
Figura 2 - Fotografia da peça cirúrgica evidenciando produto de trissegmentectomia hepática direita com tumor de 17 cm.


DISCUSSÃO
Aproximadamente 25% dos pacientes com câncer colorretal apresentam metástases detectáveis à apresentação e mais 25% desenvolvem metástases durante a evolução da doença. A doença metastática permanece como a principal causa de óbito relacionada ao câncer.2
    A ressecção hepática é o tratamento de escolha para pacientes com metástases hepáticas de câncer colorretal.2,4 O primeiro relato de ressecção para metástase de câncer colorretal ocorreu em 1941 por Richard Castell.7 Vários estudos têm demonstrado que, apesar da complexidade, as ressecções hepáticas são realizadas com taxa de mortalidade menor que 5%, sendo próxima a zero em muitos serviços.4,7 A trissegmentectomia apresenta morbidade de 26,1 a 57,9% e mortalidade de 0,8 a 6,7%.6-9 A idade, presença de doenças associadas, quantidade de transfusão de hemoderivados e experiência do cirurgião são os principais fatores que se correlacionam com a morbidade e mortalidade.6-9
    A completa ressecção de metástases hepáticas detectáveis resulta em sobrevida em 5 anos de 24 a 48%.3,9 Além disso, a hepatectomia é o único tratamento com potencial de cura.1,5 Quando comparada à história natural da doença, pacientes sem tratamento apresentam sobrevida média de 6 a 12 meses e a média de sobrevida para pacientes em tratamento quimioterápico é de 12 a 24 meses.2,4 Entretanto, as indicações são limitadas e a taxa de ressecabilidade relatada é de apenas 25%.6
    A segurança de ressecções hepáticas tem aumentado, sendo realizadas para pacientes com metástases múltiplas (22,6%), bilobares (37,9%), gigantes (28,9%) e com infiltração vascular ou biliar (17,8%).6 Apenas 3% dos pacientes indicados à cirurgia para ressecção das lesões não são submetidos a ressecção completa pelo envolvimento extenso do fígado pelo tumor.4,7 Esta abordagem mais agressiva é baseada na segurança das hepatectomias e na falta de bons resultados associada a outras formas de tratamento.
    A avaliação de critérios clínicos pode predizer aspectos associados à falha no tratamento cirúrgico, auxiliando na seleção dos pacientes candidatos a ressecção e identificar aqueles que podem se beneficiar com terapia adjuvante. A quimioterapia tem grande impacto como tratamento adjuvante em casos de doença residual mínima ou microscópica.
    As características que afetam o prognóstico permanecem incertas. Este fato tem contribuído para o aumento de outras formas de tratamento. Crioablação e ablação por radiofreqüência são promessas para o tratamento de metástases de câncer colorretal.
    Os principais fatores associados a um pior prognóstico após hepatectomia são a presença de doença sistêmica e margens comprometidas após a ressecção. A utilização de ultrassonografia intra-operatória pode auxiliar na detecção de margens comprometidas.6 O tamanho das metástases, número de lesões, nível de antígeno carcinoembrionário (CEA), comportamento do tumor primário e intervalo livre de doença são controversos quanto a sua relação com o prognóstico.4,3,6,9 Neste relato apresentamos o caso de um paciente jovem, com metástase hepática gigante, 23cm, de câncer colorretal, submetido a trissegmentectomia direita e colectomia direita simultâneas. Este relato confirma que a presença de metástase hepática gigante de câncer colorretal não é contra-indicação para hepatectomia.
    A hepatectomia também pode ser considerada para o tratamento de recorrência pós-operatória. É observado um aumento na expectativa de vida em pacientes submetidos à nova ressecção quando comparados àqueles que não receberam este tratamento.

SUMMARY: Hepatic resection is the treatment of choice for patients with metastasis from colorectal carcinoma because it offers a reasonable chance of long-term survival. A 29-year-old male lost 14 kg of weight in three months. An abdominal tomography showed a single 17 cm secondary tumor of the right lobe of the liver. A percutaneous biopsy demonstrated adenocarcinoma. A colonoscopy revealed a large tumor of the transverse colon. Carcinoembryonic antigen was 4.273 ng/ml, CA 19-9 4.759 UI/ml, and alpha-fetoprotein 2,05 ng/ml. The patient was subjected to a right colectomy and a right hepatic trisegmentectomy. The postoperative recovery was uneventful. The size of hepatic metastasis from a colorectal carcinoma is not a contraindication to hepatectomy.

Key words: hepatectomy, colectomy, colonic carcinoma, hepatic metastasis

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Endereço para correspondência:
Júlio Coelho
Rua Bento Viana, 1140 - Ap. 2202
80240-110 - Curitiba (PR)
Fone/Fax: (41) 322-3789

Trabalho realizado no Hospital Nossa Senhora das Graças de Curitiba - PR