EDITORIAL
CIRURGIA LAPAROSCÓPICA PARA CÂNCER DE CÓLON
Raul Cutait - TSBCP
Após a primeira colectomia laparoscópica, realizada por Jacobs em 1990 (1), vários cirurgiões
propuseram-se a utilizar essa via de acesso em ressecções para câncer colorretal. Ao longo dos anos, vários autores
vinham sugerindo que a sobrevida de pacientes operados por via laparoscópica era equivalente à dos pacientes
operados por via aberta (2,3,4). Entretanto, a maioria dos centros universitários preferiu aguardar dados oriundos
provenientes de estudos randomizados. Os trabalhos de alguns investigadores, como Milsom et al (5) e Lacy et al. (6),
mostraram equivalência de resultados entre as duas vias de acesso, mas tinham como principal crítica o número
relativamente pequeno de pacientes avaliados. Foi somente com o estudo multicêntrico coordenado por Nelson,
recentemente publicado (7), que a comunidade científica passou a aceitar a via laparoscópica como alternativa segura à
laparotomia para cirurgias com intenção curativa do câncer de cólon. Nessa publicação, são considerados motivos de não
se operar por laparoscopia os casos em que os tumores são T4 ou volumosos. Além disso, é dada grande ênfase
à capacitação do cirurgião, sugerindo-se, inclusive, que os hospitais credenciem os médicos com competência
para ressecções laparoscópicas para câncer de cólon. O impacto deste trabalho foi tão grande que a
American Society of Colon and Rectal
Surgeons publicou logo a seguir uma declaração, endossando a opção laparoscópica para
o tratamento do câncer de cólon (8).
A possibilidade de se realizarem as colectomias para câncer por via laparoscópica incentiva
alguns questionamentos:
1) deve todo cirurgião (ou pelo menos os especialistas em Coloproctologia) operar seus casos de
câncer de cólon preferencialmente por laparoscopia? A resposta evidente é que não, uma vez que o compromisso é
com os resultados e não com a via de acesso. Caso o cirurgião não tenha o treinamento técnico necessário ou,
então, opere poucos casos ao ano, é preferível que a cirurgia seja realizada a céu aberto, uma vez que não se
deve comprometer a qualidade da cirurgia com a via de acesso. Confesso que estou um pouco assustado com
a possibilidade de cirurgiões não adequadamente treinados fazerem seus casos por laparoscopia apenas porque
é "mais moderno". Isso me lembra os altos índices de recidiva local relatados no início da década de 80 para
a cirurgia de câncer de reto com anastomoses colorretais baixas empregando o grampeador circular, fruto de
técnica operatória deficiente e não do grampeador, como sugerido por alguns.
2) como capacitar um cirurgião para fazer colectomias laparoscópicas para câncer? A curva de aprendizado é das mais longas em cirurgia laparoscópica, uma vez que as ressecções intestinais por laparoscopia são relativamente difíceis. Assim, torna-se necessário um treinamento intenso e extenso, que compreende três etapas: operar animais, auxiliar cirurgias e, em seguida, operar auxiliado por um cirurgião experiente. Um dos problemas é a limitação de oportunidades de treinar em animais, uma vez que são poucos os locais no país que disponibilizam laboratórios para tal. Por outro lado, qual o número mínimo de casos que devem ser ajudados e operados com ajuda? Creio que isso depende da experiência prévia com cirurgia laparoscópica para outras situações, assim como da qualidade da assistência de um tutor (ou tutores) durante a fase de formação.
Referências bibliográficas
1. Jacobs M, Verdeja JC, Goldstein HS. Minimally invasive colon resection.
Surg Laparosc Endosc 1991;1:144-150
2. Larach S, Patankar S, Ferrara A et al. Complications of laparoscopic colorectal surgery. Analysis and comparison of early vs.
later experience. Dis Colon Rectum 1997;40:592-596
3. Lujan H, Plasencia G, Jacobs M et al. Long-term survival after laparoscopic colon resection for cancer: complete five-year
follow-up. Dis Colon Rectum 2002;45:491-501
4. Anthuber M, Fuerst A, Elser F et al. Outcome of laparoscopic surgery for rectal cancer in 101 patients.
Dis Colon Rectum 2003;46:1047-1053
5. Milsom JW, Bohm B, Hammerhofer KA et al. A prospective, randomized trial comparing laparoscopic versus conventional
techniques in colorectal cancer surgery: a preliminary
report. Am Coll Surg 1998;187:46-54
6. Lacy A, Garcia-Valdecasas J, Delgado S et al. Laparoscopy-assisted colectomy versus open colectomy for treatment of
non-metastatic colon cancer: a randomised trial.
Lancet 2002;359:2224-2249
7. Clinical Outcomes of Surgical Therapy Study Group. A comparison of laparoscopically assisted and open colectomy for colon
cancer. N Engl J Med 2004;350:2050-2059
8. Statement. Dis Colon Rectum 2004;47;9