ARTIGOS ORIGINAIS
ANÁLISE DA RELAÇÃO ENTRE A EXPRESSÃO DA PROTEÍNA VEGF E O ESTADIAMENTO DO CÂNCER COLORRETAL
Analysis of Relationship Between VEGF Protein Expression and Colorectal Câncer Staging
Leandro Mutschall 1,2, Paulo Condeixa de FranÇa 1, Leslie Ecker Ferreira 1, Hercilio Fronza Jr.2 , Rodrigo Blasios 2, Mauro Pinho 1,3
1. Laboratório de Pesquisas Biomoleculares, UNIVILLE, Joinville, SC, Brasil; 2. Serviços Integrados de Patologia, Joinville, SC, Brasil; 3. Departamento de Cirurgia, Hospital São José, Joinville, SC, Brasil.
Resumo: Os estudos em biologia molecular desenvolvidos nas últimas décadas, possibilitaram grandes avanços para uma maior compreensão da carcinogênese colorretal. Na década de 80 pesquisadores descobriram uma proteína com a capacidade de aumentar a permeabilidade dos vasos sangüíneos. Inicialmente esta proteína foi denominada como fator de permeabilidade vascular. Estudos posteriores correlacionaram esta proteína com o crescimento de novos vasos sangüíneos (angiogênese), quando passou a ser chamada de fator de crescimento endotelial vascular (VEGF). A proteína VEGF tem sido apontada como o principal fator promotor da angiogênese, dentre os vários já conhecidos. Neste trabalho o objetivo foi quantificar a proteína VEGF, e correlacionar os resultados com o estadiamento tumoral em amostras de adenocarcinoma colorretal. Foram incluídos 56 adenocarcinomas colorretais, nos quais a detecção da proteína VEGF foi realizada por imunoistoquímica através da construção de uma matriz tecidual e sua quantificação com análise digital de imagens assistida por computador. Nossos resultados não evidenciaram relação estatisticamente significativa entre a expressão da proteína VEGF e o estadiamento tumoral, ou presença e número de linfonodos comprometidos. Baseado no nível de expressão da proteína VEGF não foi possível inferir a presença de linfonodos comprometidos nas amostras analisadas.
Descritores: Câncer colorretal, biologia molecular, VEGF, estadiamento, imunoistoquímica
Os estudos em biologia molecular desenvolvidos ao longo das duas últimas décadas
possibilitaram grandes avanços no sentido de uma maior
compreensão da carcinogênese colorretal. Considerando a
existência de estágios intermediários determinados
pela presença de pólipos com diferentes graus neoplásicos,
Fearon e Vogelstein realizaram trabalhos pioneiros
ao analisar o processo de degeneração da mucosa
colônica normal até o surgimento de um carcinoma em
pacientes portadores de polipose adenomatosa familiar,
demonstrando a ocorrência de um acúmulo de
mutações em genes expressando proteínas com ação sobre
as divisões celulares, como a APC, k-ras, DCC e
p531, 2.
Embora estes conceitos iniciais tenham sido de grande valor, tornou-se logo evidente sua excessiva
simplicidade devido à demonstração de que estas
proteínas representavam não apenas um número
extremamente reduzido de genes/proteínas envolvidas no
processo de carcinogênese, mas também
contemplavam apenas um aspecto desta, representada pelo
distúrbio proliferativo, etapa primordial, porém insuficiente
para o surgimento da neoplasia invasiva.
Folkman (1971) propôs no princípio da
década de setenta a importante participação do
desenvolvimento de microcirculação no processo de
crescimento tumoral. Denominado como angiogênese, este
processo tem sido demonstrado como um fator de grande
relevância, uma vez que o desenvolvimento de
novos vasos sangüíneos são necessários para o suporte
de oxigênio, de nutrientes, e também para remover
moléculas tóxicas 3. A indução da angiogênese é
regulada por várias moléculas que podem ser liberadas por
células tumorais, ou células normais, incluindo
células endoteliais, células epiteliais, células mesoteliais
e leucócitos. Dentre estas moléculas esta um grupo
de proteínas chamadas de VEGF (vascular
endothelial growth factor), sendo considerado um dos mais
importantes fatores de crescimento endotelial e
indutor da angiogênese 4. Esta proteína, provavelmente
está ligada ao crescimento tumoral e ao aparecimento
de metástases. Sendo assim, supomos que a
expressão da proteína VEGF, nos carcinomas colorretais
possa apresentar-se de forma diretamente proporcional
ao grau de estadiamento tumoral, representado em
especial pela presença de metástases linfonodais.
A imunoistoquímica tem sido empregada
como técnica padrão para a identificação da expressão
e quantificação tecidual de proteínas, sendo hoje
uma ferramenta básica nos estudos de biologia
molecular. Utilizada usualmente na prática clínica através da
análise de espécimes individuais em lâminas, estudos
realizados ao longo dos últimos anos tem a associado
com a técnica Matriz de Amostras Teciduais
(Tissue Array), através da qual podemos agregar múltiplas
amostras de diferentes tecidos em uma mesma lâmina.
A quantificação imunoistoquímica normalmente é
realizada por observadores (semiquantitativa), porém
a quantificação via análise de imagens assistida por
computador vem se tornando popular no meio científico.
O objetivo do presente estudo é verificar a
hipótese de que os níveis de expressão
imunoistoquímica da proteína VEGF nos carcinomas colorretais são
maiores nos tumores com presença de metástase
em linfonodos regionais, utilizando-se uma Matriz de
Amostras Teciduais e análise de imagens assistida por
computador.
MÉTODOS
Casuística
Trata-se de um estudo retrospectivo onde foram selecionados espécimes resultantes de
56 ressecções cirúrgicas colorretais com diagnóstico
de adenocarcinoma. Essas amostras encontravam-se
arquivadas em blocos de parafina, disponíveis no
Laboratório de Anatomia Patológica SIP, localizado na
cidade de Joinville, Santa Catarina. As amostras
foram numeradas e os nomes dos pacientes não foram
utilizados, mantendo-se o sigilo. Esta amostragem foi
subdividida em dois grupos, a saber: grupo A - adenocarcinomas colorretais classificados como
Estádio I e II pela classificação TNM, ou seja, aqueles
nos quais não foi identificada a presença de
invasão neoplásica em linfonodos; grupo B -
adenocarcinomas colorretais classificados como Estádio III, ou seja,
aquelas nos quais foi identificada a presença de no
mínimo um linfonodo comprometido pelo tecido
neoplásico. Foram incluídas apenas as amostras que possuíam
presença de estadiamento tumoral completo pela
classificação TNM e cujos blocos de parafina contendo
tecido tumoral mostraram-se adequados à realização
do presente estudo.
Construção da Matriz de
Amostras Teciduais (Tissue Array)
Após a seleção dos casos, foram
escolhidos os blocos de parafina mais representativos do
espécime tumoral baseado na análise de sua lâmina
correspondente corada com Hematoxilina e Eosina (HE).
Foi feita uma revisão microscópica desta para
identificação dos segmentos com tecido tumoral, nos quais
foi extraída uma amostra do bloco de parafina
correspondente com a utilização de um "punch" descartável
para biópsia de pele, com 5 mm de diâmetro.
Multiblocos destes fragmentos de amostras foram montados,
sempre registrando a posição de cada um para
posterior identificação (Figura 1).
Figura 1 - Multibloco e seu respectivo molde. O tecido no
canto superior direito foi colocado como marcador da primeira
amostra da matriz e não pertence às amostras do estudo. |
Figura 2 - Lâmina de multibloco submetida à detecção da
proteína VEGF juntamente com as três imagens obtidas de uma das
amostras. |
Figura 3 - Imagens para detecção da proteína VEGF.
Fotos A a C: caso nº 1, escore médio de 2,15. Fotos D a F: caso nº 56, escore médio 48,36. |
ABSTRACT: Development of studies in molecular biology over the last decades has contributed for better knowledge about colorectal carcinogenesis. An important landmark in this process was the identification of a protein with effect on vascular permeability eventually named as vascular endothelial growth factor (VEGF), which seems to be essential for the angiogenesis activation of tumor development. The aim of this study was to assess the VEGF expression and correlate to tumor staging in colorectal cancer. Surgical specimens from 56 colorectal cancer patients were analyzed by immunohistochemistry for VEGF expression using a multitissue array and a computer-assisted image system. No significant result was found between VEGF expression and tumor staging or lymph nodes metastasis. We concluded that no predictive value for lymph nodes metastasis could be demonstrated by VEGF immunostaining in this study.
Key words: Colorectal cancer; molecular biology; VEGF; staging; immunohistochemstry.
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Endereço para correspondência:
Mauro Pinho
Rua Palmares 380 - Joinville - 89203-230
mauro.pinho@terra.com.br
Fax: (47) 3422-6565
Recebido em 11/11/2008
Aceito para publicação em 27/11/2008
Trabalho realizado no Departamento de Cirurgia do Hospital Municipal São José e no Laboratório de Pesquisas Biomoleculares do
UNIVILE, Joinvile, SC, Brasil.